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30.04.2025

Legal Alert | Novo regime do cliente eletrointensivo: reforço dos incentivos à indústria em Portugal

Legal Alert | Novo regime do cliente eletrointensivo: reforço dos incentivos à indústria em Portugal

A Portaria n.º 203-A/2025/1 cria um novo regime de apoio ao consumo elétrico intensivo em Portugal, com acesso alargado (mínimo de 1 GWh/ano), maior exigência ambiental e um modelo de apoio mais transparente e alinhado com normas europeias; inclui duas modalidades cumulativas — redução de encargos tarifários (CIEG) e cobertura de risco em contratos de eletricidade renovável (PPA) —, sendo a elegibilidade condicionada ao cumprimento de critérios técnicos e ambientais, aplicáveis também a instalações recentes mediante contrato de adesão de quatro anos.

Com a entrada em vigor da ​Portaria n.º 203-A/2025/1, de 24 de abril​ (Portaria), a indústria em Portugal passa a dispor de um regime de apoio ao consumo elétrico intensivo:

  • Mais acessível: O limiar de acesso em função do consumo anual foi significativamente reduzido (de 20 GWh para 1 GWh), possibilitando que mais empresas industriais possam aceder ao estatuto de cliente eletrointensivo. Segundo a estimativa do Governo, o número de consumidores elegíveis atualmente é de 319 empresas, com um apoio anual previsto de, pelo menos, 60 milhões de euros, apenas na modalidade de redução de encargos tarifários;
  • Mais exigente: Em virtude da introdução de obrigações ambientais e de comprovação mais rigorosas;
  • Mais robusto: O mecanismo de cobertura de risco foi redesenhado para maior controlo e transparência, e está mais alinhado com as normas europeias em matéria de auxílios de Estado.​
    ​Segundo anúncio realizado pelo Governo português, a Comissão Europeia pronunciou-se já favoravelmente sobre o novo regime em matéria de auxílios de Estado.

Modalidades

Estes incentivos mantêm-se disponíveis em duas modalidades:

1. Redução de encargos tarifários 

Os Custos de Interesse Económico Geral (CIEG) aplicados à Tarifa de Uso Global do Sistema (TUGS) sobre o custo da energia elétrica adquirida na Rede Elétrica de Serviço Público (RESP) são parcialmente reduzidos para os clientes eletrointensivos.

Este benefício visa compensar o peso da fatura elétrica em setores industriais com forte consumo energético e melhorar a sua competitividade.

No caso de energia elétrica produzida e consumida em regime de autoconsumo (UPAC ou equivalente), no local ou através de comunidades, que seja veiculada através da RESP, a isenção incide sobre o valor total dos CIEG aplicados à TUGS.

É igualmente importante destacar que se mantém em vigor a isenção da aplicação dos critérios de proximidade entre as unidades de produção para autoconsumo e a localização das instalações de consumo previstos no artigo 83.º do ​Decreto-Lei n.º 15/2022, de 14 de janeiro​.

2. Cobertura de risco em contratos de eletricidade renovável de longo prazo (PPA – Power Purchase Agreements)

Este incentivo visa reduzir a exposição dos clientes eletrointensivos à volatilidade dos preços da eletricidade e estimular o consumo de energia limpa, proporcionando cobertura parcial do risco de incumprimento contratual do cliente eletrointensivo, assegurada por entidades financeiras, com garantia pública parcial, até ao limite de 80% das obrigações assumidas.

Este mecanismo apenas pode ser utilizado para PPA em que a eletricidade seja exclusivamente de origem renovável, com uma duração contratual mínima de cinco anos e com uma cobertura mínima de 10% do consumo anual da instalação (com base na média dos últimos três anos ou em estimativa futura).

Os apoios previstos no regime do cliente eletrointensivo são complementares, pelo que um mesmo cliente pode beneficiar simultaneamente da isenção/redução dos CIEG e da cobertura de risco em PPA.

Requisitos de elegibilidade

Para aderir ao estatuto de cliente eletrointensivo, a instalação de consumo (com um único CPE) deve, em pelo menos dois dos últimos três anos, cumprir os seguintes critérios:

  • Consumo anual ≥ 1 GWh (incluindo energia da rede, autoconsumo e serviços de sistema);
  • Consumo nos períodos de vazio/supervazio ≥ 40% (líquido de autoconsumo e serviços de sistema);
  • Grau de eletrointensidade ≥ 1 kWh/€ de VAB (Valor Acrescentado Bruto).

Uma novidade muito relevante para a atração de novos investimentos consiste na abertura conferida pela Portaria para instalações com menos de três anos de atividade poderem igualmente aderir ao estatuto condicionalmente, devendo cumprir os critérios em dois dos três anos seguintes.

A adesão ao regime de cliente eletrointensivo é realizada através de contrato de adesão com uma duração de quatro anos estabelecido com o operador da rede elétrica de serviço público da instalação de consumo. A adesão é, contudo, condicionada por um período de três anos para instalações com menos de três anos de atividade, com extensão para o quarto ano em caso de cumprimento dos requisitos de elegibilidade.

Até 30 de abril de cada ano, o cliente deve apresentar comprovativos de manutenção dos requisitos de elegibilidade.

Obrigações energéticas e ambientais

O novo artigo 8.º-A da Portaria veio introduzir obrigações energéticas e ambientais, passando a exigir-se que cada cliente eletrointensivo realize uma auditoria energética por técnicos reconhecidos, até ao final do primeiro ano civil do contrato de adesão, salvo se já estiver abrangido pelo SGCIE (Sistema de Gestão dos Consumos Intensivos de Energia).

Durante o período do contrato de adesão, os clientes eletrointensivos devem realizar, pelo menos, uma das seguintes ações:

  • Eficiência Energética – implementação de medidas de eficiência identificadas na auditoria energética com payback igual ou inferior a três anos;
  • Redução de Emissões – investimento de um montante mínimo correspondente a 50% dos apoios recebidos enquanto cliente eletrointensivo em projetos que reduzam significativamente as emissões de GEE (gases com efeito de estufa);
  • Energia Renovável – garantir que, pelo menos, 30% do consumo de eletricidade provém de fontes renováveis, seja através de autoconsumo, garantias de origem, contratos bilaterais ou outros.

Até ao dia 30 de abril do ano seguinte ao fim do contrato, o cliente deve apresentar um relatório de execução final que inclua nomeadamente, o relatório da auditoria energética, a evidência dos investimentos realizados e o comprovativo do cumprimento das obrigações de instalação e funcionamento dos sistemas de medição e gestão.