M L

23.01.2004 Estudos de Direito do Trabalho em Homenagem ao Professor Manuel Alonso Olea • Luís Miguel Monteiro • Almedina

Regime jurídico do trabalho em comissão de serviço

A versão completa deste estudo de Luís Miguel Monteiro, publicado na XXX encontra-se disponível aqui.

Sumário

51. Introdução. 52. Âmbito subjectivo da comissão de serviço — a administração societária. 53. Regimes laboral e comercial de desempenho das funções de administração societária. 54. Outros cargos a ocupar em regime de comissão de serviço. 55. Regulamentação colectiva. 56. Efeitos do desrespeito pelo âmbito subjectivo da comissão de serviço 57. Formalização da comissão de serviço 58. Relação entre regime da comissão de serviço e contrato de trabalho 59. Cessação da comissão de serviço

 

§1. O DL 404/91, de 16 de Outubros, regula, no âmbito do Direito Privado2, a prestação de trabalho subordinado em regime de comissão de serviço'. Trata-se de disciplina jurídica que permite ao empregador ocupar, através de nomeações transitórias, de duração limitada, postos de trabalho que correspondem a necessidades permanentes da empresa.

Para isso, este regime jurídico oferece duas alternativas ao empregador: a contratação de novos trabalhadores para o efeito - comissão de serviço em sentido amplo ou externa, por recorrer a trabalhadores externos, isto é, sem prévio vínculo jurídico-laboral à empresa4 - ou o aproveitamento dos que já emprega, mantendo porém a possibilidade de, a qualquer momento, os fazer regressar ao exercício das suas funções habituais (comissão de serviço interna ou em sentido técnico).

A importância - dir-se-ia mesmo a necessidade - da figura decorre do confronto entre princípios gerais do Direito do Trabalho, concretamente, a segurança no emprego (Constituição da República Portuguesa, art.° 53°) e a irreversibilidade da carreira profissional [Regime Jurídico do Contrato Individual de Trabalho, aprovado pelo DL 49.408, de 24 de novembro de 1969 (LCT), art.° 21°/1, d)], por um lado, e as especiais exigências de confiança que determinados cargos ou núcleos de funções supõem, por outro. A prevalência daqueles princípios imporia a permanência dos trabalhadores nos mencionados cargos mesmo após o desaparecimento do laço fiduciário que justificara a nomeação, solução inaceitável à luz da valoração da confiança como elemento decisivo de determinadas relações laborais.

É certo que jurisprudência e doutrina nacionais vinham assinalando, há muito, a viabilidade legal de regimes, regra geral assentes na regulamentação colectiva, em que o exercício de funções era marcado pela dependência pessoal face ao titular da estrutura produtiva na qual se inseria o exercício funcional, com consequências a diversos níveis5. Tratava-se, no entanto, de soluções circunscritas às funções dirigentes e limitadas pela impossibilidade legal de responder à ruptura da relação de confiança através da criação de formas novas de cessação do vínculo laboral.

A disciplina legal da comissão de serviço veio submeter leque mais alargado de relações jurídicas às regras da transitoriedade da função e da reversibilidade do título profissional. O exercício de determinadas funções só se mantém enquanto perdurar a relação de confiança que as caracteriza. Após a quebra desta - porque se altera a composição do capital social da sociedade, porque muda o elenco da sua administração, porque simplesmente se revê o juízo sobre as capacidades de determinado trabalhador - é possível pôr termo ao desempenho funcional e, eventualmente, à própria relação de trabalho.

Na perspectiva do trabalhador, o recurso ao regime da comissão de serviço facilita o acesso a determinadas funções. De algum modo, democratiza certos postos de trabalho, tornando-os acessíveis em função do mérito ou da capacidade profissional do respectivo titular. Neste sentido, a comissão de serviço é mais um instrumento para dissociar titularidade e gestão da empresa: gere a unidade produtiva quem é mais qualificado, não quem é seu proprietário.

Por outro lado e como se verá, a cessação da comissão de serviço fornece ao trabalhador uma garantia alternativa importante: assegura-lhe ou um posto de trabalho ou uma compensação ressarcitória da sua antiguidade, em caso de cessação da relação contratual. E garante-lhe esta compensação mesmo que seja sua a iniciativa de ruptura, permitindo-lhe decidir livremente se aceita a regressão do seu estatuto profissional que o termo da comissão inapelavelmente importa.

As vantagens para o empregador são evidentes e centram-se no carácter temporário da prestação em regime de comissão de serviço. No caso dos trabalhadores já vinculados à empresa em momento prévio à celebração do acordo de comissão de serviço, a temporaneidade permite escapar à aplicação do princípio da irreversibilidade da carreira profissional e à proibição de baixa de categoria que aquele impõe [LCT, art.° 21°/1, d)]. No caso de trabalhadores contratados, ab initio, em regime de comissão, a mesma característica fornece uma causa específica para a cessação do vínculo laboral, dificilmente recondutível às causas gerais [cfr. Regime jurídico da cessação do contrato individual de trabalho e da celebração e caducidade do contrato de trabalho a termo LCCT), art.° 3°/2].

Deste modo, o DL 404/91 dá corpo a uma disciplina específica, que contribui para o pluralismo do Direito do Trabalho e contraria a tendência ainda hoje dominante de uniformização legislativa no domínio das relações de trabalho subordinado'. É propósito deste estudo examinar em que termos e sob que condições este regime é admitido no ordenamento jurídico-laboral.

§2. Por se tratar de regime através do qual se afastam princípios estruturantes do Direito do Trabalho, a lei preocupa-se de modo especial em delimitar o âmbito subjectivo da comissão de serviço, descrevendo taxativamente os casos que esta constitui alternativa para a contratação.

Podem ser ocupados em comissão de serviço os cargos de administração, de direcção directamente dependente da administração, de secretariado pessoal relativamente a ambos aqueles cargos e os respeitantes a outras funções previstas em Convenção Colectiva de Trabalho cuja natureza se fundamente numa especial relação de confiança (art.° 1°/1).

Cumpre analisar, um a um, todos estes casos.

A referência aos cargos de administração não se afigura isenta de dúvidas. Desde logo, há que saber se a expressão é utilizada em sentido técnico, isto é, para designar o órgão executivo da sociedade comercial, em qualquer das suas modalidades, ou numa acepção menos rigorosa, com a qual se aludiria a qualquer cargo com funções executivas ou de gestão de pessoa colectiva, situado em plano imediatamente inferior ao do órgão societário executivo.

A relação jurídica de comissão de serviço tem natureza laboral. O trabalho assim prestado é subordinado, ou seja, é realizado sob a autoridade e direcção de outrem (LCT, art.° 1°). Esta qualificação é assumida inequivocamente pelo legislador, desde logo quando reconhece a disciplina do contrato individual de trabalho como subsidiária da comissão de serviço, ao mesmo tempo que a caracteriza como "regime geral" (art.° 6°). De resto, nem de outro modo se entenderia a possibilidade de aplicação, afirmada em diversas ocasiões, da regulamentação colectiva de trabalho (cfr., art.°s 1°/1 e 4°/4), cujo conteúdo regulativo, como se sabe, tem por destinatários os trabalhadores e as entidades patronais "vinculados por contratos individuais de trabalho" [DL 519-C1/79, de 29 de Dezembro (LRCT), art.° 5°/b)].

Afirmar que a administração societária, maxime, o cargo de administrador de sociedade anónima pode ser exercido em comissão de serviço, implica, por isso, reconhecer natureza laboral, pelo menos nestes casos, à relação jurídica de administração. O problema a equacionar é, deste modo, o da natureza jurídica da relação de administração societária.

A questão, a que só é possível fazer aqui brevíssima referência, tem sido tradicionalmente abordada nos planos - distintos embora nem sempre distinguidos - da determinação da fonte da relação jurídica e da qualificação da natureza desta8.

Quanto à primeira daquelas perspectivas, alguma doutrina situa a génese da relação de administração no acto jurídico unilateral da nomeação, cuja eficácia fica sujeita a outro acto unilateral - a aceitação9. Para outros, aí existe um contrato, formado pelo encontro da vontade societária de designação, por eleição ou outro modo idóneo, com a declaração de aceitação expressa pelo administrador10. Outros ainda identificam, a par deste contrato de emprego, uma relação orgânica, que surge com a designação do administrador e tem a natureza unilateral".

Embora o problema mantenha importância à luz das outras explicações, é no domínio das configurações contratuais para a relação estabelecida entre sociedade e administrador que se acentuam os esforços para submeter a respectiva disciplina ao regime de algum dos contratos típicos. Tende, no entanto, a prevalecer a qualificação como contrato a se, designado de administração12, a que subsidiariamente ou por analogia são aplicáveis as regras do mandato13.

Àquela qualificação chega-se, também, por expressa recusa da natureza laboral da relação jurídica. No que respeita às sociedades anónimas, parte significativa da doutrina e da jurisprudência conclui mesmo pela impossibilidade legal da natureza laboral da relação de administração. É sobretudo aqui que a questão ganha relevo específico para o presente estudo, pois a proibição da natureza laboral da relação de administração societária impediria que esta se pudesse constituir e desenvolver ao abrigo de um instituto tipicamente laboral como é a comissão de serviço.

A favor da tese da impossibilidade legal tem sido invocado o preceito do artigo 398°/1 do Código das Sociedades Comerciais, do qual se conclui "que o vínculo estabelecido com o administrador societário não é um contrato de trabalho"14.

Não se afigura que o argumento possa proceder. Recorde-se que a norma mencionada se limita a estabelecer que "durante o período para o qual foram designados, os administradores não podem exercer, na sociedade ou em sociedades que com esta estejam em relação de domínio ou de grupo, quaisquer funções temporárias ou permanentes ao abrigo de contrato de trabalho, subordinado ou autónomo, nem podem celebrar quaisquer desses contratos que visem uma prestação de serviços quando cessarem as funções de administrador". O número 2 do mesmo artigo 398° acrescenta que "quando for designada administrador uma pessoa que, na sociedade ou em sociedades referidas no número anterior, exerça qualquer das funções mencionadas no mesmo número, os contratos relativos a tais funções extinguem-se, se tiverem sido celebrados há menos de um ano antes da designação, ou suspendem-se, caso tenham durado mais do que esse ano".

Como decorre da sua letra, a previsão normativa não tem por objecto a relação entre sociedade e administrador, enquanto administrador, mas a (im)possibilidade da coexistência daquele vínculo com outra relação jurídica de trabalho (subordinado ou autónomo). Recusa­-se a pluralidade de vínculos jurídicos entre sociedade e administrador, impedindo que este esteja adstrito a qualquer outra prestação, distinta da que constitui o objecto da sua administração. Cria-se impedimento ou incompatibilidade inerente ao exercício de funções de administração, evitando que a posição de supremacia e de participação na formação da vontade societária inerente àquelas funções redunde no benefício próprio, no proveito pessoal.

Não se retira da norma em apreço, por isso, qualquer argumento quanto à natureza ou qualificação jurídica da relação de administração, nem quanto à sua incompatibilidade genética com o trabalho subordinado. Nem mesmo, acrescenta-se, quanto ao regime a que a administração societária fica submetida15.

De resto, se o preceito impedisse o exercício das funções de administração em regime de trabalho subordinado, do mesmo modo recusaria para essas funções a configuração que tradicionalmente lhe és apontada, pelo menos para o efeito da aplicação, subsidiária, do regime legal do mandato. É que o artigo 398°/2 do Código das Sociedades Comerciais proíbe ao administrador não apenas o trabalho subordinado, mas igualmente o "trabalho autónomo", expressão geralmente lida como referenciando a prestação de serviços16, de que o mandato é modalidade (Código Civil, art.° 1155°). A crer nesta interpretação, o legislador também teria impedido que a administração societária fosse qualificável como mandato e, obviamente, lhe fosse aplicável o respectivo regime. Ora, a circunstância do administrador não poder prestar (outro) serviço à sociedade não é obstáculo a que preste um serviço enquanto administra a sociedade.

Por outro lado, a entender-se que a mencionada proibição expressaria a incompatibilidade entre a natureza da prestação do administrador e a do trabalhador subordinado, ela teria de abranger os cargos directivos noutros tipos societários, maxime, os gerentes das sociedades por quotas, porquanto não existem diferenças estruturais entre aqueles cargos. Ao invés e na ausência de regra expressa, tem-se concluído pela aplicação exclusiva do artigo 398° às sociedades anónimas17.

Quando se analisa a admissibilidade do exercício das funções de administração societária em execução de comissão de serviço laboral, o aspecto regimental que está em causa não é o da acumulação de vínculos jurídicos - relação de trabalho e relação de administração - mas o da apreensão da natureza de um único vínculo - o da administração. Para a resolução desta questão, as normas do artigo 398° do Código das Sociedades Comerciais em nada contribuem.

Outro argumento com frequência esgrimido para afastar a eventual natureza laboral da administração societária respeita à confusão entre o titular do poder directivo e o vinculado à direcção, isto é, à reunião, na mesma pessoa, da entidade com competência para dirigir o trabalho e punir disciplinarmente quem incumpra as suas obrigações, por um lado, e, por outro, a pessoa obrigada àquela direcção e sujeita a esta punição.

Também não se encontra, aqui, fundamento suficiente para recusar a natureza laboral da administração societária. O argumento esquece a distinção básica entre órgão, enquanto centro de imputação de interesses da pessoa colectiva, e respectivo titular, escamoteando a circunstância de, muitas vezes e a propósito de uma diversidade de matérias, o administrador formar a vontade da pessoa colectiva ou expressar uma vontade já formada, que o tem a si próprio como destinatário.

A circunstância da relação entre assembleia geral e administração não revestir as características da direcção/subordinação não depõe em sentido contrário ao afirmado. No caso em apreço, a subordinação verifica-se, tipicamente, entre o (administrador) subordinado e o dirigente, que na maioria das vezes será o órgão de administração cuja vontade é formada por intervenção decisiva de outra pessoa singular, a qual, em razão da sua participação directa no capital social ou da representação de sócio com participação relevante no capital social, molda efectivamente a vontade da pessoa colectiva.

Esta análise não conduz, obviamente, à conclusão de que a administração societária tem necessária natureza laboral. Pode tê-lo ou não, consoante se verifique, ou não, que a prestação é oferecida em termos laboralmente relevantes, isto é, que é executada de modo juridicamente subordinado ou autónomo18.

É que não se afigura possível afirmar a natureza necessariamente subordinada de certas prestações. Não existem actividades humanas por definição prestadas no âmbito do contrato de trabalho, mas situações jurídicas em que o modo de prestar revela a existência de subordinação. No fundo, todas as prestações de facere podem ser cumpridas autónoma ou subordinadamente ­a opção não se faz entre a natureza das prestações, mas entre a posição do sujeito que as presta19.

Esta conclusão alcança notável projecção no domínio em apreço. O vínculo jurídico de administração societária não tem obrigatória natureza laboral, nem tão pouco natureza oposta a esta. Tê-la-á em função do que for possível apreender sobre o modo como são exercidas as funções. Ou seja, tê-lo-á se e na medida em que a subordinação jurídica for apreensível, pela mesma forma e segundo o mesmo critério que o tem sido a propósito de outras distinções.

De resto, exactamente por não se tratar de questão relativa à natureza da prestação, é que funções materialmente idênticas nas sociedades por quotas têm sido pacificamente enquadradas no trabalho subordinado. Se incompatibilidade houvesse entre administração societária e trabalho subordinado, esta também afastaria igualmente as funções de gerência.

Entende-se, por isso, que sempre que a relação de administração societária assuma as características do trabalho subordinado — por ser prestada sob a autoridade e direcção de outrem - pode constituir-se a partir da celebração de um contrato de comissão de serviço.

Notas

* O presente estudo tem por objecto o regime jurídico da comissão de serviço no âmbito do Direito Privado do Trabalho, tal como resulta do DL 404/91, de 16 de Outubro. A circunstância de se encontrar prevista para o ano em curso a entrada em vigor do Código do Trabalho justifica as pequenas referências ao que este diploma trás de novo à disciplina da figura em apreço.

1 São deste diploma todas as disposições legais citadas sem indicação de origem.

2 Como é sabido, a disciplina jurídica da comissão de serviço foi iniciada e desenvolvida no Direito Administrativo, no âmbito do qual constitui a forma exclusiva de nomeação para determinados cargos (pessoal dirigente e equiparado — cfr. DL 427/89, de 7 de Dezembro, art.' 7'/1 e Lei 49/99, de 22 de Junho, art.' 18') e modo de funcionário com nomeação definitiva prestar temporariamente funções de carreira distinta da sua (DL 427/89, art.°s 7"/1 e 24').

3 Não se trata, porém, de intervenção legislativa pioneira, porquanto eram já conhecidas outras comissões de serviço em relações privadas de trabalho subordinado, como as que permitiam a trabalhadores de empresas públicas o exercício de funções específicas noutras empresas públicas (DL 260/76, de 8 de Abril, art.' 32'). Vide, a este propósito, as referências feitas em Jorge Leite, "Comissão de serviço", Questões Laborais, Ano VII, n.`" 16, 2000, p. 155.

4 Jorge Leite, est. cit., pp. 154 e 156.

5 Cfr. António Menezes Cordeiro, Manual de Direito do Trabalho, Coimbra, 1991, p. 672 e ss.

6 António Monteiro Fernandes, Direito a Trabalho, Coimbra, 1999, p. 213; Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 24 de Maio de 2000, Colectânea de Jurisprudência/ STJ, 2000, t. 2, p. 274.

7 Pedro Furtado Martins, "O Acordo Económico e Social e a evolução do Direito do Trabalho português", Os Acordos de Concertação Social em Portugal, I-Estudos, Lisboa, s.d., p. 135.

8 Sobre a questão, ver Ilidio Duarte Rodrigues, A Administração das Sociedades par Quotas e Anónimas, Lisboa, 1990, p. 263 e ss.; Luís Brito Correia, Os Administradores de Sociedades Anónimas, Coimbra, 1993, Partes II e IV; António Menezes Cordeiro, Da Responsabilidade Civil dos Administradores das Sociedades Comerciais, Lisboa, 1997, p. 384 e ss. Este autor conclui, no entanto, que "a situação jurídica de administração não pode ser definida corn recurso à via da sua constituição", podendo "ser contratual ou não contratual sem, por isso, perder a sua unidade" (p. 395).

9 V.g., entre nós, Jorge Pinto Furtado, Curso de Direito das Sociedades, Coimbra, 2000, p. 329, pelo menos quanto aos titulares dos órgãos que, sendo sócios da sociedade, sejam designados em assembleia geral.

10 Por exemplo, Brito Correia, op. cit., p. 454 e ss.; António Pereira de Almeida, Sociedades Comerciais, Coimbra, 1999, pp. 108 e 109; Miguel Pupo Correia, Direito Comercial, Lisboa, 2001, pp. 545 e 546.

11 Cfr. António Ferrer Correia, Lições de Direito Comercial, vol. II, Coimbra, 1968, p. 324 e ss., maxime, pp. 330 a 332 e, desenvolvidamente, Duarte Rodrigues, op. cit., p. 270 e ss..

12 Cfr. os autores citados na nota 10. Como se disse, Menezes Cordeiro recusa reconduzir a administração societária a um contrato. Não deixa, porém, de a retratar como "realidade autónoma, de cariz societário, com factos constitutivos múltiplos, privada, patrimonial, complexa, compreensiva e nuclearmente absoluta" (Da Responsabilidade Civil cit., p. 396).

13 Ferrer Correia, op. cit., p. 331; Monteiro Fernandes, op. cit., p. 167; Pupo Correia, op. cit., p. 545.

14 Pedro Romano Martinez, Direito do Trabalho, Coimbra, 2002, p. 315. No mesmo sentido, Mário Pinto, Pedro Furtado Martins e António Nunes de Carvalho, Comentário às Leis do Trabalho, I, Lisboa, 1994, nota 6 ao artigo 1O da LCT, p. 29, segundo os quais "(...) longamente se discutiu na doutrina e na jurisprudência a exacta natureza do vínculo existente entre uma sociedade e os seus gerentes ou administradores. No tocante aos administradores de sociedades anónimas, a resposta acha-se hoje contida no art. 398° do Código das Sociedades Comerciais, onde expressamente se veda a possibilidade de coexistência efectiva de um vínculo laboral com o exercício de tal função".

15 Em sentido contrário, Brito Correia (op. cit., pp. 592 e 593), para quem o mesmo preceito "pressupõe também, embora menos seguramente, que o regime da relação de administração não se identifica nem com o regime do contrato individual de trabalho, nem com o regime do contrato de prestação de serviço (trabalho autónomo): tem um regime distinto".

16 Vd. Raúl Ventura, Novos Estudos Sobre Sociedades Anónimas e Sociedades em Nome Colectivo, Coimbra, 1994, p. 193; Pupo Correia, op. cit., p. 550, nota 532.

17 Os tribunais portugueses têm decidido reiteradamente que o artigo 398° do Código das Sociedades Comerciais não é susceptível de aplicação (analógica) à hipótese de acumulação de funções de gerente de sociedade por quotas e de trabalhador: vide, por exemplo, o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça de 29 de Setembro de 1999 (Acórdãos Doutrinais do Supremo Tribunal Administrativo, 461°/784).

18 Como se sabe, a subordinação jurídica, entendida como o dever de obediência do trabalhador às ordens e instruções emergentes do credor da prestação de trabalho (LCT, art.' 11, constitui o elemento identificador central da relação de trabalho subordinado e o critério de distinção desta face a figuras próximas.

19 Ver, por todos, Maria do Rosário Palma Ramalho, Da Autonomia Dogmática do Direito do Trabalho, Coimbra, 2001, p. 70 e ss., particularmente pp. 96 a 105. A autora distingue, dentro da actividade ou prestação laborativa, correspondente à ideia de conduta produtiva livre para outrem e que constitui "o denominador comum às várias formas de prestação de trabalho valoradas pela ordem jurídica" (trabalho gratuito ou oneroso, de forma autónoma ou dependente, no contexto de um negócio jurídico privado ou de direito público) [p. 78], a actividade laboral, caracterizada "pela adição, ao binómio objectivo de troca entre a actividade laborativa e a remuneração, de um binómio subjectivo, atinente ao modo como as partes se relacionam com vista ao desenvolvimento da prestação laborativa — o binómio subordinação do trabalhador-domínio do empregador" (pp. 104-105]. Assim, a subordinação não é característica do trabalho — "este é subordinado não porque a actividade laborativa o seja mas porque o trabalhador o é ao sujeitar-se aos poderes de direcção e disciplina do empregador (idem, p. 104), o que permite concluir pela "possibilidade de desempenho da mesma actividade produtiva num enquadramento jurídico de outro tipo" (p.105).